Por FC Leite Filho
Jornal O Globo, de 23 de agosto de 1954, segunda-feira, um dia antes do suicídio do presidente Getúlio Vargas: …”O Vice-Presidente da República, Café Filho, desenvolveu, sábado e ontem, grande atividade realizando sucessivas conferências com diversas altas personalidades”. Alguma semelhança com os dias atuais? A não ser devido à mudança de cenário da época, quando quem mandava e conspirava eram os militares junto aos gerentes dos trusts, o Vice Michel Temer se engajou, há quase um ano, numa maratona de “conferências” com os donos do poder da atualidade: empresários, banqueiros, executivos de multinacionais, barões da mídia e políticos da oposição golpista, e de lá para cá passou a ser seu mais fiel intérprete.

Tendo amaldiçoado sua biografia com a terrível pecha de um dos maiores traidores da República, o vice João Augusto Fernandes Campos Café Filho, tinha sido eleito na chapa de Getúlio, só que com uma diferença substancial em relação a Temer. Café era uma figura nacional conhecida, por causa de sua atuação como deputado e advogado de sindicatos, tinha sido eleito vice-presidente, de forma separada, alcançando uma diferença de 200 mil votos (nada desprezível para um total de 8.254.989 de votos apurados)  sobre seu adversário da UDN, Odilon Braga. Já Temer não teve um único voto, uma vez que, pela legislação atual, o vice simplesmente faz figurar (daí sua irritação com seu papel decorativo) seu nome na chapa do candidato titular, no caso, Dilma Rousseff, isso ocorrendo nas postulações vitoriosas de 2010 e de 2014. O atual vice é, por seu turno, uma figura apagada para o restante da população, os movimentos sociais e as entidades civis,  só transitando entre as cúpulas políticas e empresariais, que o fizeram três vezes presidente da Câmara e duas vice-presidente da República.

Voltemos àquela edição de O Globo, já à disposição na internet, para que melhor nos inteiremos do perfil daquele irrequieto vice de Getúio e hoje nos inspiremos para enteder a figura do vice da Dilma.  “Entre estas conferências mantidas pelo Sr. Café Filho, a mais importante, sem dúvida, foi a que realizou no sábado, às 16 horas, no Palácio do Catete (sede do poder na antiga capital Rio de Janeiro), com o Sr. Getúlio Vargas. O Sr. Café Filho, emocionado com a gravidade da situação nacional, fez uma demorada exposição ao Sr. Getúlio Vargas, sobre o últimos acontecimentos, bem como das perspectivas de uma luta fratricida. Acabou sua exposição propondo uma dupla renúncia, a do Sr, Getúlio e a dele próprio, em benefício da salvação nacional”.

O final da história, todos conhecemos: Getúlio, percebendo que Café blefava, pois sabia da adesão de seu vice ao golpe, recusou a proposta, dizendo que só morto deixaria o Catete. Café Filho, então, retrucaria: “Rejeitando a proposta, não devo mais lealdade ao Presidente da República. Caso o senhor, desta ou daquela maneira, deixe este palácio, a minha obrigação é vir a ocupá-lo”. Café Filho, como sabemos conseguiu seu intento, assumindo a presidência, no mesmo dia do trágico suicídio presidencial, no 24 de agosto de 1954, para completar o restante do mandato, então em vigor, de menos de dois anos, ou seja, terminando em 31 de janeiro de 1956:

Café Filho, como todo apressadinho, acabou comendo cru. Foi deposto, um ano depois, pelo seu ministro da Guerra, general Henrique Lott, junto com o presidente da Câmara, Carlos Luz, o primeiro na linha sucessória. Isto aconteceu logo depois de o candidato de Café e dos conspiradores anti-getulistas, o general Juarez Távora, ter perdido a eleição presidencial de 1955 para o civil Juscelino Kubitsheck. Lott, na realidade, havia dado um golpe preventivo,  que chamou de”retorno aos quadros constitucionais vigentes”, matando na unha o complô que se urdia entre os mesmos anti-getulistas contra a posse de JK , dessa forma, salvando a democracia por quase dez anos.

Agora, passados 61 anos do episódio Café Filho, um outro vice, Michel Miguel Elias Temer Lulia, rasga a fantasia de político recatado, reputação que até lhe valeu o cargo de coordenador político do governo, lançando-se a uma aberta conjura contra o titular da Presidência da República, no caso, uma mulher, Dilma Vana Rousseff, a quem ele acaba de mandar uma verdadeira carta-bomba, onde estaria contida a senha para um novo golpe contra a sofrida democracia brasileira. Nela, Temer tenta inverter os papéis, se fazendo de vítima, ao dizer: “A senhora não confia em mim”.

Veja aqui a íntegra da carta, publicada no site G1

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